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Fitoterapia no SUS, como avançar?

Ana Carla Prade
01 de junho de 2023

É com grande alegria que retorno às colunas aqui no Planta Ciência, trazendo aos nossos leitores o olhar da fitoterapia na perspectiva dos profissionais de saúde, dos serviços e programas desenvolvidos pelos municípios aqui no Sistema Único de Saúde (SUS). Sim, digo aqui no SUS porque sou uma profissional que trabalha com a fitoterapia e com um dos modelos de Farmácia Viva em São Bento do Sul, Santa Catarina, e junto a vários colegas luto pela fitoterapia como alternativa e complemento terapêutico nas diferentes linhas de cuidados.


Quem acompanha o desenrolar da fitoterapia no SUS, percebe que os programas de fitoterapia vêm enfrentando reais dificuldades de implantação, de financiamento, de manejo e, inclusive, de uma tímida adesão por parte dos profissionais de saúde das diferentes categorias. Com exceção de alguns programas já consolidados, como o Farmácia Viva do Distrito Federal e Farmácia Viva de Jardinópolis (que também não estão isentos de desafios!), a grande maioria ainda corre atrás de soluções para as diversas questões que englobam os desafios que os gestores dos Farmácias Vivas atravessam.


Não cabe aqui discutir cada um destes desafios (que podem ser abordados em outros momentos), mas pulverizar algumas estratégias para fortalecer a fitoterapia como recurso terapêutico e assim propor uma demanda na qual estes programas justifiquem sua existência.


É conhecido por todos que o estudo da fitoterapia não é contemplado nas grades curriculares da maioria dos profissionais de saúde, ficando este assunto muitas vezes a cargo de disciplinas optativas ou mesmo dentro de disciplinas sobre Práticas Integrativas e Complementares (PICS). Este conteúdo, transmitido em poucas horas e com pouco aprofundamento, fica vago nas mentes dos estudantes (e futuros profissionais), deixando as plantas medicinais em um “limbo” terapêutico. Mais tarde e após a formação, estes profissionais deparam-se com protocolos clínicos definidos com fluxogramas e direcionamentos claros para prescrição, indicação, contraindicação e exemplos da terapêutica para os medicamentos sintéticos que viabilizam e ordenam suas indicações/prescrições. Mas será que encontramos esta realidade para as plantas medicinais e fitoterápicos?


Então surgem as perguntas: como instituir programas de fitoterapia sem a devida capacitação dos profissionais de saúde? E quando instituído, por que não pensar em protocolos clínicos para a utilização de plantas medicinais e fitoterápicos para as queixas de saúde simples e recorrentes na Atenção Primária?


Pensei nisso e me deparei com profissionais que não fazem ideia de como inserir uma planta medicinal em um esquema terapêutico. Compreendendo que saúde mental é uma demanda de qualquer profissional de saúde, independente da área em que ele esteja atuando, e que a prescrição de psicotrópicos é um ato de extrema especialização e conduta. Aqui em São Bento do Sul organizamos uma estratégia para a consolidação e adesão da fitoterapia através de um protocolo em saúde mental. As espécies Lippia alba e Cymbopogon citratus, ambas com uso tradicional consolidado para sintomas de ansiedade leve, constam no Formulário de Fitoterápicos da Farmacopeia Brasileira (FFFB) e são espécies de cultivo e manejo simples. O Farmácia Viva elaborou um protocolo de saúde mental com o uso destas espécies e realizou treinamentos com a equipe do CAPS para a utilização destas espécies em pacientes que se enquadravam no grupo I da estratificação de risco em saúde mental e que eram recebidos pelas equipes de acolhimento, compostas por enfermeiras e fisioterapeutas. Com o treinamento e com a aplicação do protocolo, estes profissionais puderam indicar estas espécies com segurança para os usuários enquanto eles aguardavam os encaminhamentos, tão normais no SUS.


A utilização deste protocolo e a compreensão dos profissionais da forma como indicar por escrito estas espécies, quais pacientes se enquadram e quais não se enquadram no protocolo foi bastante esclarecedor para a equipe que passou a indicar com critérios as plantas e de forma individualizada. O treinamento no protocolo, de forma presencial, com a apresentação da espécie medicinal, da droga vegetal, da forma de indicação por escrito/prescrição e do fluxograma de inclusão e exclusão foi fundamental para adesão dos profissionais treinados. O resultado deste trabalho conjunto foi a inscrição deste treinamento e do protocolo na “Amostra Brasil Aqui tem SUS”, no Congresso de Secretarias Municipais de Saúde, organizado anualmente pelo Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (COSEMS) em consonância com o CONASEMS (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde). Nosso trabalho foi apresentado neste congresso, realizado em março de 2023 em Capivari de Baixo-SC, com mais de 400 trabalhos e fomos selecionados entre as 20 melhores experiências catarinenses do SUS para apresentá-lo em Goiânia, no Congresso Nacional de Secretarias Municipais de Saúde.


O que podemos concluir neste texto (com jeitinho de desabafo) é que para a fitoterapia avançar precisamos de treinamento e ferramentas concretas de inclusão de plantas medicinais e fitoterápicos nos esquemas terapêuticos, com segurança e eficácia. Capacitar o profissional de saúde que atende na ponta, ou seja, aquele que atende diretamente os pacientes, é fundamental para promover o uso deste recurso terapêutico que ainda está relegado às cartilhas informativas, que são importantes, mas não abordam a terapêutica de forma concreta. Se as instituições de ensino superior das diferentes áreas da saúde não avançam neste sentido precisamos nós, os profissionais responsáveis pelos Farmácias Vivas, tomar a ponta deste movimento e capacitar nossas equipes com informações relevantes para a prática clínica utilizando plantas medicinais e fitoterápicos.

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