Este site pertence a Leopoldo C. Baratto, fundador e coordenador do PlantaCiência. 2019. Relatos de uma aprendiz na Índia: 30 dias de imersão no Ayurveda
top of page

Relatos de uma aprendiz na Índia: 30 dias de imersão no Ayurveda

Nina C. Barboza da Silva
18 de março de 2020

Em 2019 me inscrevi num curso sobre Ayurveda no Rio de Janeiro. Ao final de 10 meses de curso, tive a oportunidade de participar de uma imersão de 30 dias no sul da Índia, numa cidade chamada Coimbatore, para aprofundar os meus estudos. O que farei aqui nesta coluna é dividir com vocês, leitores do PlantaCiência, um pouco da minha experiência nesta jornada de aprendizado.  Vou começar tentando responder à pergunta que mais ouço: o que é esse tal de Ayurveda mesmo???


O Ayurveda, ou Ciência da Vida, é um sistema de cura indiano de tempos imemoráveis, com origens em um passado distante muito anterior ao surgimento da escrita e, portanto, a qualquer registro que possamos ter acesso hoje. Há quem acredite que este conhecimento, bem como os fundamentos da cultura indiana e modos de vida, tenha sido revelado a sábios indianos (rishis) diretamente do deus Brahma, dando origem aos Vedas. Transmitido de forma oral, de geração em geração, os Vedas foram posteriormente organizados na forma de textos, entre 3.000 a 1.200 a.C. É importante dizer que encontramos citações do uso de plantas em todos os quatro Vedas, mas é no Atharva-Veda, de aproximadamente 1.200 a.C., onde estão referências específicas sobre plantas, descrições de doenças e outros procedimentos. Este é o Veda mais relacionado aos textos ayurvédicos posteriores (Shamhitas), onde encontramos as bases do Ayurveda sistematizadas e generalizadas: Charaka Samhita, Sushruta Samhita e Asthanga Sagraha & Hridhaya. Muito além do entendimento de “ciência da vida”, Charaka escreveu que “o Ayurveda é a ciência que indica o que é apropriado e inapropriado, condições de vida feliz ou com sofrimento, o que é auspicioso ou não para a longevidade, assim como a medida da vida por si só” (Charaka Samhita cap. I/41).


Segundo os textos clássicos do Ayurveda, toda matéria é formada por 5 elementos (Panchamahabhutas): éter, ar, fogo, terra e água. A combinação destes é manifestada no corpo como três doshas: Vata (éter + ar), Pitta (fogo + água) e Kapha (água + terra). Esses doshas formam nossa constituição (prakrti), estando os três presentes em todos nós, sendo que um deles costuma ser predominante frente aos demais. Quando estão em estado de equilíbrio, resultam no funcionamento harmonioso do corpo humano. Porém, quando em desequilíbrio levam a uma mudança na nossa condição (vikriti) podendo se manifestar como doenças e levar à morte. A cura para as doenças consiste em restabelecer o equilíbrio dos doshas. Centenas de plantas, seus usos e formas de preparo são citadas no Charaka e Sushrutra. Entretanto, a manutenção da saúde no sistema de cura Ayurvédico não é alcançada apenas através do uso de plantas medicinais, ou seja, não está em uma droga vegetal ou procedimento específico, mas sim envolve uma série de cuidados. Para mantermos a saúde, três fatores fundamentais são: alimentação adequada, sono de qualidade e uma série de práticas diárias (Dynacharya). Mas por que o Ayurveda não se baseia apenas no uso de “remédios” para curar as doenças? Porque neste sistema terapêutico o foco não está em tratar a doença e sim em tratar o ser humano, a pessoa. No Ayurveda entendemos que somente quando possuímos bem estar físico, mental e espiritual é que estamos em equilíbrio com nossa constituição e, assim, livres de doenças. Não adianta querermos usar uma planta para determinado mal se não procuramos identificar a causa daquele mal.


Essa visão milenar, que vê o ser humano como um ser integral, corresponde ao conceito atualmente adotado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), onde saúde é “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades”. No Brasil, desde 2017 o Ayurveda é parte das Práticas Integrativas e Complementares no SUS.

Colunas - Slideshow
bottom of page