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As seringueiras de Xapuri

Gabriela Moysés
08 de junho de 2023
Revisado por Leopoldo C. Baratto

Recentemente mudei de estado, deixei a agitação carioca e vim morar no interior do Acre, mais precisamente na cidade de Xapuri, também conhecida como “princesinha do Acre” ou “terra de Chico Mendes”, por ser a terra natal desse renomado seringueiro, sindicalista e ambientalista brasileiro. Lembro-me bem de quando cheguei no estado do Acre, após pousarmos em Rio Branco, caímos na estrada e rodamos em torno de 180 km até chegarmos na rodovia conhecida como Estrada da Borracha (AC-485), rodovia que é a porta de entrada para Xapuri.  Não pude deixar de contemplar a beleza das árvores altas que estavam presentes dos dois lados da estrada, com as folhas se unindo de tal maneira que dava a impressão de estarmos passando por um túnel natural. Me perguntei que árvores eram aquelas, pergunta que em breve foi respondida quando vi a placa “Túnel das Seringueiras”. Um pouco mais a frente, ainda nessa mesma estrada, me deparei com uma fábrica de preservativos masculinos, que no momento encontra-se com poucas atividades, mas que foi construída e atuou durante alguns anos produzindo preservativos de látex provenientes de seringais nativos.


Observando todo esse cenário nas terras de Xapuri, comecei a refletir: Chico, seringueiros, seringais, látex, borracha... Ao mesmo tempo em que essas palavras despertavam o meu interesse em querer saber mais sobre a história desse município de aproximadamente 20 mil habitantes do alto Acre, minha mente de cientista de produtos naturais não pode deixar de refletir acerca da árvore seringueira e da sua importância para a sociedade.


A seringueira é uma árvore originária da região amazônica brasileira. É encontrada facilmente na margem de rios e lugares inundáveis da mata tropical úmida. Pertencente ao gênero Hevea e à família Euphorbiaceae, existem mais de onze espécies de seringueiras, mas devido à alta qualidade do seu látex, a Hevea brasiliensis é a principal representante. A seringueira é a árvore produtora do látex, matéria-prima usada na fabricação da borracha natural. Quanto as propriedades químicas, o látex é um polímero, nomeado de cis-1,4-poli-isopreno, da classe dos politerpenos. Ele é um elastômero, ou seja, polímero que tem como principal característica a elasticidade. É na casca da seringueira que são encontradas as estruturas secretoras que contêm o látex, chamadas de vasos laticíferos. No processo de extração, os profissionais nomeados de seringueiros fazem cortes inclinados nas cascas das árvores, para liberar o produto de aparência branca leitosa e pegajosa, que é recolhido geralmente em uma tigela. O látex obtido é levado para unidades de processamento, onde são realizadas as etapas de coagulação e vulcanização, para obtenção da borracha natural. Através da borracha natural, são produzidos inúmeros materiais presentes no nosso dia a dia, como pneus de automóveis, tecidos impermeáveis, brinquedos, calçados, luvas cirúrgicas, entre outros.


A seringueira foi protagonista de um importante período econômico na Amazônia, durante o século 19 e começo do 20. O ciclo da borracha, como ficou conhecido, proporcionou riqueza e causou transformações culturais e sociais no país. A princípio, o Brasil era o único produtor de borracha natural no mundo. No entanto, durante vários anos, num dos clássicos exemplos de biopirataria, os ingleses roubaram as sementes de Hevea brasiliensis e as levaram para suas colônias no sudeste asiático, onde a borracha passou a ser produzida também em outros locais, levando a produção brasileira a completa derrocada.  Atualmente, na região Amazônica, a extração de látex em seringais nativos ainda é uma importante fonte de renda para as populações rurais. Contudo, a produção brasileira de borracha não é o suficiente para atender as necessidades da indústria nacional.


Além de seu conhecido uso na produção da borracha, a Hevea brasiliensis também possui outras finalidades. Estudos na literatura afirmam que a biomembrana produzida a partir do látex natural de Hevea brasiliensis auxilia na cicatrização de feridas. Além disso, as sementes da planta são ricas em vitaminas e proteínas, podendo ser usadas na produção de suplementos alimentares.


Berço da revolução acreana entre os anos de 1902 e 1903 e palco do movimento de resistência dos seringueiros em defesa dos seringais nativos da região, sob a liderança de Chico Mendes na década de 1980, Xapuri é um município histórico. No brasão da cidade, estão presentes o símbolo da confluência entre o Rio Acre e Xapuri, a estrela altaneira, símbolo da Revolução Acreana, além da machadinha e da seringueira, memorizando dessa forma, a importância dos seringueiros e da seringueira para a região.

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